Episódios que envolviam registros e relatos de objetos voadores não identificados (OVNIs) foram tratados como conspiração e até piada por autoridades ao longo dos anos. Pronunciamentos oficiais eram inimagináveis. Entretanto, essa situação mudou e deve sofrer uma transformação profunda daqui em diante. Um indício considerável foi o relatório inédito divulgado na sexta-feira, 25, pelo Serviço de Inteligência dos Estados Unidos com os dados coletados pelo governo ao longo das duas últimas décadas. “As informações não são conclusivas”, diz o documento, decepcionante para quem esperava a confirmação. Mas o esforço para a sua elaboração e as palavras escolhidas pelas autoridades demonstram que o assunto começou a ser abordado com seriedade. Não foram encontrados indícios de “atividade alienígena”, mas também não se descarta essa possibilidade definitivamente. “Falta informação suficiente em nossa base de dados para atribuir incidentes a situações específicas”, informa o governo americano. Foram analisados mais de 140 episódios envolvendo pilotos militares, a maioria deles americanos, que encontraram objetos não identificados durante seus voos. Desse total, 18 apresentam “padrões incomuns de movimento ou de características de voo” das tecnologias já existentes.
Ao longo do relatório, as autoridades norte-americanas apontam cinco possíveis explicações:
- Objetos dispersos no ar, como balões, animais voadores e outros semelhantes;
- Fenômenos atmosféricos, desde cristais de gelo a flutuações térmicas;
- Tecnologias de países vistos como ameaça pelos EUA, como Rússia e China;
- Tecnologias secretas do governo estadunidense ou de empresas privadas;
- Para os casos que não apresentam alguma explicação, o governo diz que serão necessários novos estudos e avanço tecnológico.
A decisão de divulgar as informações foi colocada em um pacote aprovado pelo Congresso em dezembro de 2020. Na época, o gabinete do diretor de Inteligência Nacional e o Departamento de Defesa recebeu seis meses para apresentar uma análise. Antes disso, em agosto, a Defesa havia anunciado a criação de uma força-tarefa dedicada à detecção, análise e catalogação de OVNIs que pudessem representar ameaça aos EUA. Meses antes, o governo confirmara a veracidade de três vídeos que mostram a reação de pilotos ao se depararem com supostos objetos não identificados (veja um deles no tuíte abaixo).
EUA publicam vídeos de avistamentos de OVNIs.
Assista: pic.twitter.com/OqQ36ctydV
— Jovem Pan News (@JovemPanNews) April 27, 2020
Mudança de tom das autoridades
Tradicionalmente, OVNIs são associados com alienígenas. Entretanto, essa relação não é correta, uma vez que muitos fenômenos podem ser causados por drones, balões meteorológicos ou falhas nos sistemas. Mesmo assim, autoridades dizem que alguns casos são difíceis de explicar. Uma das figuras públicas que se posicionou foi o ex-presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Em entrevista ao apresentador James Corden, ele disse que existem casos cuja causa não foi identificada pelo Serviço de Inteligência. “O que é verdade, e eu estou realmente falando sério agora, é que há imagens e registros de objetos nos céus que nós não sabemos exatamente o que são. Não podemos explicar como se movem, sua trajetória. Eles não tinham um padrão facilmente explicável”, exclamou Obama. A declaração do democrata repercutiu e foi comentada por Jen Psaki, porta-voz de Joe Biden, atual presidente dos EUA. Ela afirmou que a atual gestão “leva muito a sério e investiga cada um dos relatos de incursões de qualquer aeronave, identificada ou não, no espaço aéreo americano”. Em entrevista à Fox News, John Ratcliffe, ex-diretor de Inteligência Nacional, afirmou que a quantidade real de casos é muito superior à divulgada ao público e que vários episódios têm “ações que são difíceis de explicar, movimentos difíceis de replicar, para os quais não temos tecnologia”. John Brennan, comandante da CIA durante o governo Obama, declarou em um podcast que considera “um pouco presunçoso e arrogante acreditar que não há outra forma de vida”.
Para o pesquisador de campo Marco Aurélio Leal, que também trabalha com projetos audiovisuais relacionados ao tema, a mudança de abordagem por parte das autoridades é positiva. Segundo ele, a comunidade ufológica mundial ficou ansiosa pela liberação de documentos sobre o tema. “Mas também chamou muito a atenção foi o depoimento de Bill Nelson, diretor da NASA, que anunciou que a instituição irá começar a estudar os fenômenos UAPs [sigla em inglês para fenômenos aéreos não identificados] cientificamente. Disse também que, quando trabalhava na inteligência do Comitê de Serviços Armados do Senado, chegou a conversar com os pilotos que relataram a observação do fenômeno em pleno voo e concluíram que era real. Segundo informantes da Inteligência, nós teremos mais vazamentos de vídeos e documentos relacionado às pesquisas por parte da Marinha americana”, disse Leal. Para o pesquisador, a mídia nacional deveria dar mais atenção e aumentar a seriedade das abordagens sobre o tema. “Cada vez mais vem crescendo o número de interessados no assunto. Quando começam a prestar mais atenção, percebem que se trata de algo sério e intrigante. Já a imprensa internacional parece levar o assunto mais a sério”, explica.
Ao falar sobre a relação dos estudos com o Brasil, Marco Aurélio cita documentos sigilosos das Forças Armadas que foram liberados e que contêm informações sobre o tema, incluindo relatos sobre a “Noite Oficial dos Óvnis no Brasil”. “Em nosso país, foram liberadas mais de 11 mil páginas de documentos sigilosos das Forças Armadas com informações descrevendo objetos voadores não identificados que refletiam inteligência em suas manobras, chegando a ser detectados por radar da Força Aérea, voando a mais de 15 mil quilômetros por hora. Este ocorrido foi no ano de 1986 e ficou conhecido como a Noite Oficial dos Óvnis no Brasil. Muitos outros documentos descrevem a atuação desses fenômenos em nosso espaço aéreo”. Ao analisar as perspectivas sobre a divulgação de documentos, o pesquisador disse estar esperançoso de que os dados ajudem a entender os fenômenos. “Espero que em breve, de maneira oficial, com a ciência à frente da pesquisa, possamos ter um avanço no entendimento destes fenômenos que tanto intrigam a humanidade”, concluiu.